“Não é que eles não consigam ver a solução. Eles não conseguem é ver o problema.”
— G.K. Chesterton
Eliminar as barreiras
Com 72 anos, Jim é um queixoso crónico. Já aprendi, há muito tempo atrás, que não é preciso comprar o jornal ou ligar a televisão para saber o que está mal no mundo; está cheio de pessoas como Jim, que falam constantemente de tudo o que está mal. As queixas, as intrigas, as críticas e o pensamento negativo são alguns dos hábitos mais fatais.
A pouco e pouco, o negativismo desgasta a saúde das pessoas e elimina a possibilidade de se sentirem felizes. Se alguém próximo de si está constantemente a queixar-se, a fazer críticas, ou a pensar sempre de forma negativa, o seu próprio bem-estar encontra-se em risco.
As queixas sobre coisas que estão para além do nosso controlo é um dos hábitos mais destrutivos. Sim, eu sei, é também uma das coisas mais comuns que as pessoas fazem. Queixamo-nos do clima, falamos de tudo o que diz respeito aos escândalos da celebridade do momento, culpamos o governo – qualquer governo – por tudo aquilo que está mal.
Queixarmo-nos de coisas que não podemos controlar é uma forma eficaz de evitarmos enfrentar as coisas sobre as quais podemos agir ou fazer algo para mudar. Enquanto passa a vida a queixar-se de coisas que não tem nenhum poder para mudar, Jim evita confrontar o seu próprio azedume e pensamento negativo.
Jim quer que toda a gente mude. Ele culpa toda a gente pelos seus problemas: os seus pais, os colegas de trabalho, o governo, a economia local. No seu estado actual, ele não pode começar a entender que a sua infelicidade não tem nada a ver com nenhuma dessas coisas, mas por outro lado está directamente ligada ao seu hábito de culpar os outros por tudo o que está mal na sua vida.
Jim não sofre de nada que coloque claramente a sua saúde em risco. Não fuma, não bebe, não toma drogas nem come demasiado. Mas a sua saúde está a falhar, e ele está preocupado com a eventualidade de necessitar de uma cirurgia. Embora o pensamento negativo não esteja directamente associado ao cancro ou às doenças cardíacas, os investigadores começam a encontrar evidências que parecem demonstrar que o ressentimento, a amargura e o ódio matam literalmente as pessoas.
Jim não vê qualquer motivo para mudar a sua atitude ou o seu comportamento. Ele é um exemplo clássico de uma pessoa que é incapaz de reconhecer a verdadeira causa da sua infelicidade. Jim está em negação.
A negação é a primeira fase no ciclo da mudança individual. A grande maioria das pessoas cuja saúde, felicidade ou relacionamento estão a ser afectados por um hábito auto-destrutivo levam meses, se não anos, numa fase em que negam ou rejeitam a seriedade do problema.
Nesta fase, as pessoas apresentam as seguintes características:
- Recusam admitir que têm um problema grave.
- Resistem à mudança e normalmente tornam-se agressivas quando são confrontadas com a necessidade de mudança.
- Têm uma sensação geral de desespero, por muito que aparentemente as suas vidas pareçam preenchidas.
Muitas pessoas que têm hábitos auto-destrutivos sofrem também de sentimentos de angústia. As pesquisas sugerem que mais de 50% dos utilizadores de drogas têm alguma forma de depressão. E a miséria adora companhia: tendemos a estabelecer relacionamentos com pessoas que têm os mesmos maus hábitos que nós.
Enquanto passam tempo sentadas ao balcão de um bar, as pessoas podem convencer-se a si próprias que esta é uma forma normal de relaxar ao fim de um dia de trabalho, porque muitas outras pessoas estão também no bar a fazer a mesma coisa. As pesquisas demonstram que as pessoas clinicamente obesas estão menos predispostas a perder peso quando vivem com outras pessoas igualmente obesas.
Comportamento auto-destrutivo
Muitas pessoas estão tão obstinadas na sua necessidade inconsciente de defenderem os seus maus hábitos que recusam ajuda, mesmo se as suas vidas dependem dela.
Em Mudar para Sempre, James Prochaska refere uma experiência surpreendente feita por um zoólogo chamado Calhoun. Em vez de recorrer a ratos de laboratório (cobaias) na sua pesquisa, Calhoun estudou ratos “selvagens”, de forma a observar de que modo eles lutavam para manter o controlo sobre o seu próprio comportamento.
Numa experiência, Calhoun deu aos ratos um interruptor eléctrico que permitia que eles escolhessem uma luz suave, uma luz clara ou não terem luz nas suas gaiolas. Ao ser-lhes permitido que fizessem a sua própria escolha, os ratos evitavam as luzes claras e a escuridão; uma vez após outra, eles ligavam a luz suave. Mas quando a luz suave era ligada pelo experimentador, os ratos corriam para o interruptor e desligavam-no. Então, ligavam a luz clara ou deixavam a gaiola na escuridão.
Numa outra experiência, os ratos tinham o controlo de um interruptor que activava uma roda giratória, que era a sua única fonte de exercício. Os ratos em gaiolas necessitam de correr cerca de oito horas por dia, para permanecerem saudáveis. Sem qualquer indicação, os ratos ligavam o interruptor da roda e corriam em diferentes alturas do dia.
Sempre que o experimentador ligava a roda, os ratos desligavam-na imediatamente, ainda que a primeira parte da experiência tenha demonstrado que os ratos queriam e precisavam de exercício.
Prochaska chamou a esta atitude a “liberdade tola”. Os ratos de laboratório são demasiado domesticados para exibirem este tipo de comportamento. Prochaska salientou que os ratos selvagens “exigiam o controlo sobre o seu comportamento, mesmo que isso significasse sacrificar a sua própria saúde”.
Relacionamentos de apoio
As pessoas que se encontram em negação perderam o controlo do problema, o que significa que perderam o controlo das suas vidas. Estas pessoas raramente progridem para a fase seguinte sem o benefício de um relacionamento de apoio.
Os conselheiros profissionais, os terapeutas e outros profissionais de ajuda já aprenderam que o confronto não ajuda a que a pessoa passe da fase 1 para a fase 2. Ser “chato” não ajuda. Deixar a pessoa seguir o seu caminho – ou “ir na onda” dela para evitar o confronto – apenas reforça a negação do problema, consolidando na sua mente a ideia que qualquer coisa que fizer está bem.
Normalmente, as pessoas precisam de uma resposta inesperada antes de poderem eliminar as barreiras. Este é um facto imutável desde há 3000 anos, como ilustra a história seguinte.
O Rei David foi um dos heróis da antiga Israel.
Foi o líder da sua nação, um grande guerreiro, um talentoso músico e um dos maiores poetas da Antiguidade. Quando era um jovem pastor, enquanto guardava o rebanho do seu pai, matou um urso e um leão com as suas próprias mãos. Quando era apenas um adolescente, matou Golias no campo de batalha.
Uma noite, o Rei saiu da cama e subiu ao telhado da sua casa. Viu uma linda mulher a lavar-se, não muito longe dali. Mandou de imediato os seus homens descobrirem quem ela era. O seu nome era Betsabé. Era a esposa de um soldado chamado Urias, um dos mais bravos e leais soldados de Israel.
Urias estava longe de casa, servindo a sua nação numa guerra contra um dos muitos inimigos de Israel. David mandou chamar Betsabé e dormiu com ela. Ela ficou grávida.
O Rei queria que Urias ficasse fora do seu caminho.
O exército israelita encontrava-se a cercar uma cidade nesse momento. David enviou uma carta ao comandante do seu exército, Job, onde dava instruções para se livrar de Urias. Disse a Job que enviasse Urias para a linha da frente da batalha e que depois retirasse com os restantes soldados, deixando Urias sozinho.
Job cumpriu a ordem do Rei e Urias foi morto na batalha. David fez de Betsabé sua mulher, e ela deu-lhe um filho.
Existem muitas coisas aqui que são muito piores que fumar, gastar demasiado, ser pessimista ou comer demais – traição e crime, só para nomear apenas dois. E tudo começou com o voyeurismo de David, algo indecente por si só. Como é que diria a um rei que ele está a criar alguns hábitos perigosos?
Se acha que é difícil dizer a alguém da sua família que deve derrubar algumas barreiras do seu comportamento, imagine o que o Profeta Natanael tinha contra si. Natanael sabia o que se estava a passar. Como profeta, cabia-lhe ajudar o rei a abrir os olhos.
Natanael não confrontou David directamente. Em vez disso, ele contou ao Rei uma história sobre dois homens que viviam na mesma cidade. Um deles era rico, o outro era pobre. O homem rico tinha muitos rebanhos e manadas. A única coisa que o homem pobre tinha era um cordeiro. O homem pobre amava o cordeiro como se fosse seu filho.
Uma noite, o homem rico precisou de um cordeiro para um jantar de festa. Em vez de sacrificar um cordeiro do seu próprio rebanho, ele levou o cordeiro do homem pobre. Quando o Rei David ouviu isto, ficou furioso – pensou que Natanael estava a contar-lhe uma história verdadeira sobre dois homens no seu reino.
“O homem que fez tal coisa deverá morrer,” disse o Rei.
Então, Natanael disse a David, “Vós sois esse homem.”
David escutou a história de Natanael, e isso abriu-lhe os olhos. Porque é que não podemos ouvir melhor? Porque é que não conseguimos ver os nossos próprios erros de forma tão clara como os outros os vêem? É tão fácil saber quando os outros estão em negação, e virtualmente impossível admitirmos que estamos nesta fase.
Na linguagem da terapia moderna, o Profeta Natanael foi o relacionamento de apoio do Rei David. Ele confrontou David, mas não através de um acto de agressão verbal directa. Ele criou incerteza em David, ao responder de uma forma que David não esperava de todo. Foi isto que permitiu que David abrisse os olhos.
A incerteza é o que conduz a que procuremos novas opções.
Natanael sabia que era impossível mudar uma pessoa, mas sabia que podia motivá-la a querer mudar por si própria. O seu papel como auxiliar é apoiar a outra pessoa durante o processo de mudança individual, e não atacá-la ou rejeitá-la.
Mas nem todos podemos ser sábios como Natanael. Mas existe sempre uma forma de ajudar alguém, abrindo-lhe os olhos sem entrar em confronto directo, o que muitas vezes causa danos irreparáveis para todos os envolvidos.
Se alguém próximo de si está em negação, você já está preparado para ajudar da melhor forma, por ter lido esta informação. Não vá “na mesma onda” dessa pessoa, não seja transigente e, acima de tudo, não a confronte abertamente.
A melhor coisa que pode fazer é dar-lhe este texto. Quando essa pessoa ler a história de Natanael e do Rei David, poderá estar pronto para dizer, “Eu sou esse homem”.
Se você já está realmente predisposto para se libertar dos maus hábitos, então já está na próxima fase.