“Não somos bonecos indefesos… não nos comportamos de forma acidental.”
— Ernst G. Beier
Consciencialização – Quando Você Sabe que Tem um Problema
Nesta fase, as pessoas sabem que têm um problema e querem compreendê-lo, mas não sabem o que fazer ou sentem-se sem forças para mudar. Na fase 2, as pessoas ainda estão longe de fazerem um compromisso para mudar.
Muitas pessoas ficam presas nesta fase. Passam anos a dizerem a si próprias que “um dia” vão mudar.
O medo de falhar faz com que muitas pessoas fiquem presas nesta fase. Escondem-se da verdade dizendo a si mesmas que estão à espera do programa “perfeito” para perder peso, para deixar de fumar ou para deixar de beber.
“Eu vou mudar quando for a altura certa” é uma das frases que mais se ouve das pessoas nesta fase do ciclo de mudança individual. Nunca vai existir uma “altura certa”, é claro, mas elas ainda não estão aptas a romper com esta prisão verbal.
Nesta fase, algumas pessoas nunca estão prontas para fazer um compromisso sério para mudar, mesmo se a sua vida depende disso. Todos estamos familiarizados com as lutas e experiências diárias de pessoas que estão presas nesta fase.
O meu sogro morreu recentemente, após uma longa luta contra o enfisema. Mesmo sendo obrigado a dormir com uma garrafa de oxigénio à beira da cama, nunca deixou de fumar. Reduziu, mas nunca abandonou, mesmo sabendo que isso estava a matá-lo.
Há alguns anos atrás, li sobre uma mulher em New Jersey que foi sujeita a uma traqueotomia, antes de morrer de cancro. Após a traqueotomia, como já não era capaz de respirar pela boca, colocava cigarros na abertura que tinha na garganta e inalava o fumo dessa forma.
Sinais de perigo
As pessoas na fase 2 ainda estão a focalizar-se no problema. Querem falar sobre elas próprias e sobre a família; podem ser bastante abertas ao falarem do seu problema. O que mantém as pessoas nesta fase é muitas vezes o medo da mudança.
Até mesmo uma boa mudança ameaça a nossa segurança. Quando estamos habituados a alguma coisa, pensamos que perder isso pode causar-nos pânico e mantém-nos onde estamos, não obstante tudo o que podemos ganhar com a mudança.
Olga é uma viúva com três filhos, com idades entre os vinte e os trinta anos. Conheceu um homem chamado Chuck e voltou a sentir novamente a experiência do amor. Chuck é divorciado e mudou-se recentemente para a cidade onde Olga vive. Na casa dos quarenta anos, trabalha numa empresa de construção e aparentemente não tem problemas em encontrar trabalho, se não fosse o problema com a bebida.
Poucos meses antes de os conhecer, Olga e Chuck deixaram a cidade. Quando os filhos de Olga perceberam que a mãe andava a sair com um alcoólico, ficaram naturalmente assustados e pediram à mãe que terminasse a relação.
Quando Olga recusou deixar de ver Chuck, os seus filhos disseram à família que receavam que a mãe estivesse a envolver-se num relacionamento perigoso. Quando toda a família confrontou Olga, ela fez aquilo que qualquer terapeuta experiente teria facilmente previsto: deixou a cidade com o seu carro, as suas roupas e o seu novo namorado.
Uma noite, estava eu a dar o meu passeio pela vizinhança quando Olga parou o seu carro e perguntou se podia falar comigo. O que se seguiu foi uma triste e comum história de uma mulher apaixonada pelo homem errado.
Quando Olga e Chuck regressaram à cidade, Olga usou os seus contactos para encontrar um bom emprego para Chuck. Chuck mudou-se para um apartamento que Olga tem. O apartamento é vizinho à casa onde Olga vive com os filhos. Olga contou-me que Chuck paga a renda e que é amável com os seus filhos.
Mas Chuck tornou-se verbalmente agressivo com Olga. Não abusou dela fisicamente, mas as agressões verbais tornaram-se intoleráveis. Olga é hispano-americana. Nasceu nos Estados Unidos. Quando Chuck bebe, grita com Olga e diz-lhe para voltar para o México. De cada vez que Chuck a insulta, Olga pergunta-lhe porque é que ele não volta para onde quer que veio.
Olga é o exemplo clássico de uma pessoa na fase 2. Ela está consciente do problema. O mau hábito de Olga é a sua baixa auto-estima, que é a única coisa que impede que ela termine com este relacionamento abusivo. Tal como qualquer mau hábito pode ser abandonado, a baixa auto-estima pode ser mudada através de uma imagem individual mais saudável. Mas leva tempo.
Olga sabe que a segurança dos seus filhos pode estar em risco. Até ao momento, Chuck nunca teve uma atitude mais violenta, mas Olga começa a perceber que está a brincar com o fogo. Mesmo com a relação tão má como está, Olga não quer perder Chuck. “Eu amo-o,” diz ela, “Ele não vê como está a magoar-me?”
Olga reconhece que a sua vida pode estar em perigo. Chuck disse que gostaria de a levar consigo para uma outra zona do país. Olga receia que a mudança para um sítio onde não tem qualquer relacionamento de apoio faça com que fique ainda mais vulnerável do que já está. “Ele pode levar-me para lá e depois decidir matar-me,” disse ela.
Chuck não tratou mal Olga ou os filhos, e Olga não quer dizer a Chuck que saia. Ela não consegue agir, o que é um problema comum nas pessoas na fase 2. Em vez de dizer a Chuck para partir, ela pergunta-lhe porque é que não vai sozinho. Neste ponto, foi o mais longe que ela conseguiu chegar.
Libertar-se
Olga receia perder a vida a que se habituou, mesmo sendo a vida insatisfatória e arriscada que é. Ela preocupa-se com a sua situação dia e noite, mas até à data é tudo o que consegue fazer.
Um dos maiores perigos nesta fase é substituir a preocupação com o problema, actuando sobre ele. É o que define Olga. Se você está em posição de ajudar alguém que se encontra na fase 2 do ciclo, mantenha sempre em mente os pontos seguintes:
- As pessoas nesta fase precisam de apoio, de serem ouvidas e de feedback (retorno).
- Não dê conselhos, a não ser que lhe sejam pedidos.
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Normalmente, as pessoas nesta fase precisam de um empurrão para agirem, mas isso não significa que você seja a pessoa indicada para fazer essa pressão.
Tentar empurrar a pessoa para tomar uma atitude antes que ela esteja preparada para o fazer pode ser um grande erro. Nesta altura, a pressão só fará com que a pessoa fique ainda mais resistente à mudança. As pessoas que estão presas na fase 2 têm um melhor conhecimento do problema, mas esqueceram aquilo que sabem. Demasiadas vezes, deve acontecer uma tragédia pessoal antes que a pessoa nesta fase esteja apta a seguir em frente.
Olga sabe aquilo que deve fazer. Ela ainda não consegue fazê-lo, mesmo que o bem-estar da sua família esteja dependente da sua capacidade para agir. Este comportamento é típico das pessoas na fase 2 do ciclo. Olga não veio ter comigo em busca de conselho. Ela já conhece todas as razões para terminar a relação que precisava de saber, e já começa a perceber que, quanto mais tempo passar sem fazer nada, provavelmente a situação irá piorar.
Olga é como um fumador que não está pronto para deixar de fumar. Muitos fumadores estão perfeitamente conscientes do mal que estão a fazer à sua saúde. John diz repetidamente que quer deixar de fumar, mas que não consegue. A verdade é que John não quer deixar de fumar.
John sabe os riscos que a saúde dos fumadores tem de enfrentar. Mas não quer abdicar de todos os pequenos prazeres que o cigarro lhe dá: a antecipação do prazer que ele sente quando, ao fim de uma refeição, acende um cigarro; o prazer de sentir o cigarro entre os dedos; o fluxo de nicotina que vai directamente para o seu cérebro, de cada vez que ele fuma; a segurança de saber que tem um volume extra da sua marca favorita escondido no roupeiro.
A única parte do tabaco que John quer abandonar é a parte que provoca danos nos pulmões e que poderá causar-lhe cancro; ele gostava de poder eliminar essa parte e ficar com todos os outros pequenos benefícios que o prendem ao cigarro. As pessoas como o John não querem deixar de fumar, não importa quantas vezes digam que querem.
John não está a mentir quando diz que quer deixar de fumar. Ele pensa sinceramente que quer. O seu problema é que ele ainda não aceitou o verdadeiro motivo por que fuma. Assim que ele conseguir fazê-lo, estará em posição de seguir em frente. Quando ele for capaz de admitir que gosta de muitas das pequenas coisas que o vício lhe proporciona, estará em posição de substituir os seus hábitos destrutivos por outros mais saudáveis.
Enquanto ele se esconder da verdade – dos verdadeiros motivos que o levam a fumar – estará a passar convenientemente uma responsabilidade que é sua para uma “força” que é superior a ele. Quando um fumador diz, “Eu quero mesmo deixar de fumar, mas não consigo”, aquilo que ele na verdade está a dizer é que não quer ser responsável pelas suas más escolhas.
Para muitas pessoas, existe um certo conforto em acreditar que não podem evitar o caminho destrutivo que estão a seguir, mesmo sabendo para onde esse caminho os leva. Estas pessoas estão presas numa mentalidade auto-destrutiva que diz: “Tudo bem, eu sei que estou condenado, mas o que é que posso fazer sobre isso?”. A resposta é que podem fazer muito sobre isso, mas só quando estiverem preparados para verem realmente o que estão a fazer.
Porque é que fazemos estes jogos, mesmo quando sabemos que os nossos hábitos nos destroem? Penso que a resposta será algo como: assim que destruirmos a prisão em que nos escondemos, seremos forçados a admitir que temos o poder de mudar os nossos hábitos.
Isto pode ser uma coisa assustadora. Uma pessoa que se liberta de um hábito que tem dominado a sua vida durante anos, ou décadas, pode ficar aterrorizada pela perspectiva de ter de admitir que perdeu uma grande parte da sua vida por não ter tomado para si a responsabilidade do seu próprio comportamento.
Se você se encontra num relacionamento de apoio com uma pessoa nesta situação, ou se você é corajoso o suficiente para admitir que é essa pessoa, ganhe coragem e lembre-se disto: é melhor ter perdido parte da sua vida do que ter perdido toda a vida. Nunca é tarde para mudar a sua vida. Assim que o fizer, irá perceber que afinal nem tudo foi perdido – apenas demorou mais algum tempo para atingir o seu objectivo.
Alguém que você conhece pode estar a beber até morrer, mas inconscientemente essa pessoa diz a si própria que já é tarde demais para se libertar desse mau hábito. Se fosse livre, iria passar o resto da vida a questionar-se sobre tudo o que teria feito se tivesse percebido mais cedo que tinha a liberdade de fazer melhores escolhas.
Este é o perigo de olhar para o passado. Quando todos vemos o que fica para trás, não estamos aptos a compreender que as novas oportunidades surgirão assim que tomarmos a decisão de caminhar numa direcção diferente.
A capacidade de uma pessoa deixar de ter os seus pensamentos no passado e caminhar para o presente é a chave para passar da fase 2 para a fase 3. Você não poderá tomar uma decisão para mudar enquanto estiver preso ao seu passado.
Assim que decidir mudar, você estará no final da fase 2. O próximo passo do ciclo para se libertar de um mau hábito consiste na fase de preparação.